Como o desmatamento piorou as inundações na Indonésia
As inundações que deixaram mais de 700 mortos na Indonésia devem-se principalmente às chuvas de monção que atingiram esse país asiático e a uma tempestade tropical excepcional. Mas outro fator pode ter influenciado: o desmatamento.
Tanto os ambientalistas quanto os especialistas e o governo indonésio apontaram o papel que a perda de florestas desempenhou nas enchentes repentinas e nos deslizamentos de terra.
Quando as florestas desaparecem, elas não conseguem mais absorver as precipitações nem estabilizar o solo com suas raízes, o que torna as áreas afetadas mais propensas a esses desastres naturais que, nos últimos dias, também forçaram o deslocamento de 1,2 milhão de pessoas, segundo dados governamentais.
A Indonésia é um dos países que sofre as maiores perdas anuais de florestas. Em 2024, desapareceram mais de 240.000 hectares de floresta primária, embora um pouco menos do que no ano anterior, segundo uma análise do projeto Nusantara Atlas da startup de conservação The TreeMap.
"As florestas das bacias altas atuam como uma barreira protetora, um pouco como uma esponja", explicou David Gaveau, fundador da The TreeMap.
"O dossel florestal captura parte da chuva antes que ela atinja o solo. As raízes também ajudam a estabilizar o solo", explicou.
Por outro lado, "quando as florestas das bacias altas são derrubadas, a água da chuva escorre rapidamente para os rios, causando enchentes repentinas", com seu consequente efeito devastador, acrescentou.
- "Prevenir o desmatamento" -
Por isso, os defensores do meio ambiente há anos instam o governo a proteger melhor as florestas do país, que, com sua absorção de dióxido de carbono, são um ativo importante na prevenção do aquecimento global.
O próprio presidente, Prabowo Subianto, reconheceu na sexta-feira que "é preciso impedir o desmatamento e a destruição das florestas".
As inundações arrastaram não apenas torrentes de lama, mas também madeira cortada, o que reforça o argumento sobre a ligação entre o desmatamento e o desastre vivido.
Em uma praia de Padang, na ilha de Sumatra, a AFP viu trabalhadores da agência ambiental cortando com motosserras troncos empilhados na areia, que a água arrastou até lá.
Segundo vários meios de comunicação, o Ministério das Florestas está investigando acusações de corte ilegal nas áreas afetadas.
"O pêndulo que oscila entre a economia e a ecologia parece ter se inclinado demais para o lado da economia, e precisa se reequilibrar", disse no fim de semana o ministro das Florestas, Raja Juli Antoni.
Em uma das áreas mais atingidas, Batang Toru, pelo menos sete empresas estão presentes, aponta Uli Arta Siagian, do grupo indonésio de conservação Walhi.
"Há uma mina de ouro que já devastou cerca de 300 hectares de floresta" e "a usina hidrelétrica de Batang Toru resultou no desaparecimento de 350", acrescenta.
Outras extensões de floresta foram derrubadas para se tornarem plantações de óleo de palma. "Tudo isso contribui para agravar nossa vulnerabilidade", enfatiza Uli Arta Siagian em declarações à AFP.
- Proteger e restaurar -
"A mudança substancial na cobertura florestal é o principal fator por trás das enchentes repentinas", afirma esse responsável, que acusa o governo de conceder permissões para minas e plantações "de maneira imprudente e negligente".
A taxa de desmatamento em Sumatra supera a média do restante da Indonésia, aponta por sua vez Herry Purnomo, diretor para este país do Centro de Pesquisa Florestal Internacional (Cifor-Icraf).
O desaparecimento das florestas aumenta o risco de inundação por outro fator: na ausência de árvores que retenham o solo, a terra é arrastada pelos rios, elevando o nível do leito destes, que, portanto, perdem capacidade para continuar absorvendo água, observa.
Purnomo enfatiza que "é necessário fazer duas coisas: prevenir o desmatamento e restaurar florestas".
F. Tavares--JDB