
Congresso argentino reverte veto de Milei a fundos para deficientes

O Congresso argentino reverteu pela primeira vez, nesta quinta-feira (4), um veto do presidente Javier Milei, tornando inapelável uma lei que concede mais recursos a pessoas com deficiência, uma área sobre a qual pairam suspeitas de corrupção que atingem a irmã do chefe do Executivo.
O revés político ocorre no pior momento para o governo, alvo de um escândalo de supostos subornos na Agência Nacional de Deficiência (Andis), um caso investigado pela justiça.
Também acontece em um ano eleitoral que terá legislativas nacionais em outubro e, no próximo domingo, eleições na província de Buenos Aires, o distrito mais populoso da Argentina, governado pela oposição peronista.
O Senado reverteu o veto por 63 votos a 7. Em agosto, a Câmara dos Deputados já havia rejeitado a medida presidencial.
A lei, que agora será promulgada, declara emergência na área de deficiência. Tinha sido aprovada em julho e estabelece a regularização de pagamentos atrasados a prestadores de saúde.
A norma define uma nova modalidade para o cálculo das pensões por deficiência e garante os serviços até dezembro de 2027.
Do lado de fora do Congresso, centenas de pessoas afetadas pela medida comemoraram a decisão legislativa.
"Me dá muita felicidade, como trabalhadora, mas também para que a pessoa com deficiência possa viver como merece", disse à AFP Trinidad Freiberg, 23 anos, musicoterapeuta que trabalha com crianças com deficiência.
Milei havia adiantado, em uma entrevista em agosto, que, caso o veto fosse revertido, recorreria à Justiça. "Suponhamos que me rejeitem o veto, bem, eu vou judicializar isso, não terá efeito sobre o gasto público", havia dito o presidente.
O mandatário, que viajou aos Estados Unidos para reuniões com empresários em Los Angeles, vetou a lei sob o argumento de que sua aplicação colocaria em risco o equilíbrio das contas públicas, um dos pilares de seu governo.
No entanto, o Escritório de Orçamento do Congresso calculou que o impacto fiscal da lei ficaria entre 0,22% e 0,42% do PIB.
- Suspeitas de corrupção -
Durante a sessão, a oposição pediu a interpelação da secretária-geral da Presidência, Karina Milei, em relação ao escândalo que a vincula a supostos subornos na provisão de medicamentos justamente para a área de deficiência.
"A secretária Milei deveria esclarecer qual é a situação, que é de extrema gravidade. A sociedade está pedindo isso", disse o senador opositor Sergio Leavy.
Áudios atribuídos ao ex-titular da Andis, Diego Spagnuolo, demitido assim que o escândalo estourou, atribuem a Karina Milei o recebimento de subornos de 3% sobre os pagamentos de medicamentos.
O presidente assegurou que são "mentiras", denunciou "espionagem" e um juiz ordenou cessar a difusão dos áudios de Karina Milei.
"Para encobrir um caso de corrupção recorrem a uma estratégia midiática e judicial (...) Nada de Karina, o chefe da quadrilha é o irmão", acusou o senador opositor José Mayans.
Milei costuma se referir à irmã como "A Chefe", apontando-a como sua mão direita e a artífice de sua carreira política.
A favor do veto se manifestou a senadora Carmen Álvarez Rivero, do PRO, partido aliado ao governo.
"A prioridade é dar transparência e melhorar a gestão (...) Acompanho o veto presidencial, considero que esta lei não é necessária e volto a perguntar aos senhores senadores: como está indo o plano de desestabilizar o presidente Milei?", disse a senadora.
A rejeição do veto e o escândalo de supostos subornos ocorrem ainda no âmbito de uma crise de confiança dos mercados financeiros, que se traduziu em pressão de alta sobre o dólar, obrigando o Tesouro a intervir no mercado cambial.
E.R. Xavier--JDB